30/05/2009

A MINHA SORTE VALE R$1,00

Desempregada, solteira, sem dinheiro, há uma semana praticamente confinada em casa... e ainda por cima... de TPM! Puta-que-pariu!
A verdade é que, naquele sábado, era pra mim que o dia não ia muito bem... Nada bem. Acordei por volta de 14h30 com a sensação de serem 6h da matina. O corpo pesado e o humor dos dragões... um bafo de onça e o pobre do meu filho aqui, aturando a mãe. Minha mãe e meu irmão estavam saindo para um bloco animadíssimo, destes que tem aos montes no carnaval... Mas pra mim, são mais sinal de causadores insuportáveis de trânsito do que motivo de alegria, na verdade. Especialmente em dias de tpm, como aquele sábado.
Um amigo havia dito que reservaria um convite para eu assistir seu espetáculo "Cachorro", já que estou tão dura que nem as cinco pratas eu estava podendo... Como eu teria que pedir ao meu ex-marido para buscar o meu filho mais a noite, meu corpo era uma granada e o pavio não existia... deduzi que na real, a medida mais cuidadosa era ligar imediatamente para o pai do meu anjinho e pedir que ele o retirasse rapidamente da zona de risco – eu estava a ponto de explodir. Assim foi feito. Após dar o almoço e o banho, permiti ao pequeno mais alguns instantes de entretenimento no computador – ele é todo metido a tecnológico e adora os jogos do cartoon network, disney, jetix e discovery kids. O interfone tocou e então, meu filho estava a salvo.
Algumas tentativas frustradas de contato com o meu amigo para lembrá-lo sobre o convite não me fizeram desitir de finalmente sair de casa. Liguei para Santa vovó Yvonee pedi R$5,00 como ajuda de custos para que eu pudesse me locomover até a Gávea e depois voltar para casa (a passagem de ônibus custa R$2, 10). Minha Santa avó atendeu ao pedido de socorro e com uma nota de R$5,00 libertou a neta de seu confinamento. Após alguns instantes de papo entre as duas, o relógio marcava dezenove horas e cinco minutos alaranjados. É que estes celulares da moda tem display metido a moderninho, cool. Despedi-me de minha Santa vovó Yvone - imaginei que seria adequado sair com aquela antecedência, pois embora fosse apenas atravessar o túnel, seria bom chegar um pouco antes do horário para verificar o lance do convite. A peça estava marcada para começar às 20h.
Segui até o ponto de ônibus e julguei mais prudente pegar a van que ia para Gávea pelo túnel do que o ônibus 178, com mesmo destino, mas cujo trajeto incluia uma volta a mais - e havia um certo engarrafamento nesta volta a mais. Entrando na van, encontrei uma velha amiga, Marcela Leite – alguém com quem não tenho contato freqüente, mas muito carinho. Ela me chamou com empolgação. Comprimentamo-nos alegremente e sentei ao seu lado. Como está sua irmã e como vai seu pai, o que sua mãe anda fazendo da vida e seu irmão já deve está enorme, como vai o novo emprego e quando me dei conta, a van estava indo não pelo túnel, como de costume, mas pela Avenida Niemeyer - e um trânsito ferrenho me fazia suspeitar que eu chegaria estourando o limite do relógio. Enfim, procurei aproveitar aquele encontro inesperado. Conversamos um pouco , eu e Marcela , e quando eu estav no auge do último episódio trágico da minha relação teoricamente amorosa, toca o telefone de Marcela - Imagina só? Era o auge! É claro que eu estava no grau máximo de euforia, gesticulando feito uma louca, fazendo caras e bocas, defendendo veementemente minha razão integral na história, envolvidíssima com o presente momento revivendo o instante passado. - Ela falou por algum tempo e desligou. Retomei do ponto onde havia parado, mais calma serena e podenrada, é claro. Ela estava interessadíssima, afinal minha histórias são sempre profundas, densas, gregas, e muito dialogava com minhas questões durante a conversa. O telefone tocou de novo. - Eu sorri, tentando demontrar a simpatia de uma pessoa compreensiva, serena, controlada, afinal de contas era seu pai. Família, né? A gente tem que ter respeito pela família dos outros. Eu não ia gostar se fizessem cara feia pra minha mãe mesmo que ela estivesse do outro lado do telefone. Mas aquela ligação já estava durando cerca de dez minutos e quando um pai passa mais de cinco minutos numa ligação... Pode ter certeza, o esporro tá comedo! - Ainda bem que eu não tenho pai - Dito e feito, Marcela desligou e disse: " É que eu perdi a bolsa da faculdade e meu..." TRIIIIIIIIIIIIIMMMMM "Alô, oi pai..."
Aí foi até quase o fim da Avenida Niemeyer naquele blá blá blá, mais do lado de lá do que do lado de cá, porque a voz da Marcela mesmo, eu ouvi poucas vezes. No total, ela deve ter passado cerca de vinte minutos só nesta ligação. Marcela finalmente desligou. Ai eu quase gozei, já estava virando uma necessidade vital terminar aquela história, até porque, vinte minutos entubando pra poder contar. Empolgadíssima, eu abri a boca e ia emitir o primeiro som quando a Marcela disse: Ai, rapidinho, amiga, agora tenho que ligar para o Pedro – o novo caso com quem ela estava indo encontrar no Leblon – "Oi Pedro, foi mal, é que eu estava no telefone com meu pai e tal... tá, pode ir saindo de casa, peraí... Moço, vou saltar aqui, na esquina daAtaulfo! Oi Pedro, então tá bom, daqui a pouco a gente se vê. Beijo." – Eu ainda estava com a boca aberta, paralisada na mesma posição. Queria poupar o tempo de abrir aboca pelo menos e aproveitar o último minutinho que restava pra contar meu drama. Mas ali estava a esquina da Ataulfo. Marcela lamentou por não termos conversado mais, nos despedimos com dois beijinhos e ela desceu.
Eram 20h05 e a peça já havia começado. Pensei que se eu corresse, de repente chegava a tempo de entrar.A van me deixou na Bartolomeu Mitre, próximo ao Hospital Miguel Couto. Corri, corri, corri, corri, corri até o Planetário. É verdade que parei algumas vezes. Uma puta dor no peito, fumante é foda! Com bronquite ainda por cima... Melhor nem comentar. Chegando no Planetário logo avistei a Luciana Martoni. Ela estava na porta com toda pinta de produtora. Ela e mais uns dois funcionários do teatro. A janela da bilheteria estava fechada por uma madeira idêntica ao resto da parede do lugar.
"Oi, Luciana, a peça já começou, né..." Ela começou a me responder: "É, e você sabe como é o teatro aqui, né, depois que fecha..." Minha vontade naquele momento foi de sentar exatamente ali onde eu estava e chorar...mas chorar muito, muito mesmo! Choro de mulher desempregada, solteira,com uma fortuna de R$3,00 no bolso, enfurnada há uma semana dentro de casa, sem qualquer mililitro de alcóol no sangue, recém saída de um trânsito ferrenho, com TPM filha-da-mãe e barrada na porta do teatro depois de correr a Maratona dos Fumantes Fudidos. Ainda assim, eu resperei fundo - não tão fundo senão o choro podia vazar - e tentei, juro que tentei, simpaticamente falar sobre o horror que estava o trânsito, culpando estes blocos animadíssimos de carnaval pelo meu atraso. Prometi voltar no dia seguinte e com antecedência. A minha sorte é que o dia seguinte era aquele último domigo do mês, quando os teatros da prefeitura do Rio vendem seus ingressos a R$1,00.

elA

Um comentário:

Anônimo disse...

cotidiano ferrenho... rsrs

bj Chico