Ela não precisa de espaço nem tempo, não precisa de dentro nem fora, nem motivo ou causa, nem ponteiro parado, televisão sem som, som quebrado, multidão vazia, nem de gente cheia de tudo, nem de tudo nem de nada, nem coisa alguma. Ela é coisa democrática, silenciosa, verborrágica, ela em qualquer forma. Ela na veia correndo por todo corpo, efeito instantâneo e latente. Só lhe dão se você deixar... e um espaço vazio, sem quinas, sem cor, sem gente, sem móveis. Só você e a agulha. Fina, pequena, indolor, prata, na veia, agulha, suave... Ela entra macia e faz aquele pic. Só lhe dão se você deixa entrar. E você deixa. E entra, é denso e seria amargo se tivesse gosto... líquido entrando denso no corpo e o corpo olha por teto que não há. E o teto é branco e o céu nublado e as espumas e azul do céu sem nuvens e o mar azul e o barulho chuá que vai e que vem e a água molhada na areia gelada que cobre o pé das unhas vermelhas do esmalte risqué que começou a descascar no dedão. E o gelado do coco na garganta que desce enquanto o opala 86 passa preto na rua e buzina antes de o sinal abrir. Os pés que caminham sobre areia fofa antes de pisarem no chão de metal desenhado do ônibus da linha 177 que vai em direção a praça Mauá. A agulha sai num rompante do braço mas isso não é nada comparado ao lirismo das altas montanhas cheias de curvas e árvores, montanhas com nome de pão-de-açucar brilhando verdes parecendo veludo da luz que sol assina nesse espetáculo... altas belezas naturais logo ali atrás dos espelhos d'água, as águas vistas pela janela que anda ali no aterro do Flamengo. E de repente tudo isso some. Não tão lírica é a gorda - ela é enorme, um mundo praticamente, não é só gorda, é obesa mesmo, e mórbida ainda por cima - a gorda que acaba de levantar ao lado e cobrir toda a visão da cena. Sem pedir lincença, ela levanta e ainda passa o seu gigantesco quase sufocante traseiro na sua cara. Ela se vai e a vista volta. O pão-de açucar já foi e agora o que se vê é... ih! Moço! Abre aqui pra mim? O que se via era o posto BR na Osvaldo Cruz. Escuro. Está escuro agora. Não estava quando os pés pisaram a areia fofa. O porteiro não está na cadeira. Nossa, a parede da portaria do prédio é marfim? Não é branca? Jurava que era... E o piso? Que isso? O piso é de mármore e de losangos e é preto e é branco e... um poste no canto direito. Um poste no canto direito? Um poste também de losango e também branco e também preto e alto e colonial e cafona no canto direito! Cafonérrimo! Um poste cafonérrimo no canto direito? 16 anos morando num prédio preto e branco cafonérrimo... Isso é constragedor. As plantas até que não incomodam embora não falem nem andem e pareçam mortas mesmo estando vivas. Ai que nojo!!!! Uma lagartixa branca passando com o rabo pela metade no losango. Será que o rabo dela ficou se mexendo quando ela o perdeu? De que cor será que a lagartixa vê o mundo? Será que ela vê vendo? De repente a lagartixa é cega.... Mas se é cega, pra que que tem olhos? O que? 25º? O elevador está parado há 10 min no 25º? Ok... Ok... Tudo sob controle... É só a neurótica do 2504 fazendo obra pela 25ª vez. Tudo bem. Todo mundo tem problemas e o dela é síndrome do nunca estou satisfeita com nada por isso muda o carro a cada seis meses, a cor do cabelo toda semana, a do esmalte a cada 5 minutos e o marido ela nem tem porque antes de assinar os papéis ela resolve que deve mudar também. Mas eu não tenho nada com isso, não moro no vigésimo quarto, nem no décimo quinto e não estou fudida por causa da obra dela - posso subir de escada, afinal o terceiro andar não é tão longe assim, mesmo tendo o play e duas garagens antes. Caramba, o play e as duas garagens... O problemas são essas duas garagens. Ai, caramba. Morta. Tô morta, que isso? Muito morta! Pelo amor de jesus cristo senhor amado nosso, o que é isso? Uma pessoa com 25 anos não pode passar mal desse jeito subindo três andares, um play e duas garagens! Ih, a luz! Ficou acesa. Hum... Que fome! Será que o estrgonofe de terça-feira está estragado? Ai é negativismo isso. Uma pessoa otimista se perguntaria se o estrogonofe ainda está bom. Ai! Cadeira reclinável... como essa cadeira é macia. Cadeira grande marrom macia reclinável. Cadeira de preguiçoso. Frio. Merlot. Cadê as taças? Taças de vinho de vidro de cor branca de poeira de anos sem usar. Taças vazias. Taças cheias de nada dentro delas. Taças com o pano que esfrega esfrega esfrega. Transparentes as taças estavam depois do pano e antes do vinho que desce desce desce aos poucos saindo da boca verde de vidro da garrafa do Merlot que saiu da bolsa branca do supermercado coração vermelho cor de unhas descascadas. Computador ligado. Teclas brancas com letras pretas Duas taças. Iniciar e um link branco cor de teto e de nuvem e de espuma com "W" azul Microdsoft Word. Times New Roman número 12. Não... Explorer. Internet Explorer, "e" azul mas este azul é claro diferente do Microsoft Word que é azul escuro. Duas taças de vinho ao meu lado. Uma é minha. A outra é sua. Trospecosaoaverso.blogspot.com. Ai... tropecos ao a verso ou tropecos a verso? Nunca sei como é... Quem foi a criatura que fez esse negócio de colocar de um jeito no login, outro no nome e um terceiro no endereço??? G- zuis! Hein, meus olhos azuis??? Ou foram os olhos cor de Mel? Nova Postagem escrito em branco dentro de um quadrado laranja. "Ela" foi a primeira palavra antes que o resto das letras começassem a aparecer e... um gole. Duas taças. Uma é minha e a outra é sua. Um gole que desce desce desce e entra denso e seco e amargo desce e caminha por dentro do corpo de todo o o corpo e a tela branca, tudo branco as pareces o chão o teto, não há móveis, não há nada além você no meio. Espaço vazio, sem quinas, sem cor, sem gente, sem móveis. Só você e a agulha. Fina, pequena, indolor, prata, na veia, agulha, suave... Ela entra macia e faz aquele pic. Só lhe dão se você deixa entrar. E você deixa. E entra, é denso... líquido entrando denso no corpo e o corpo olha pro teto que não há. Duas taças entre mim a tela branca povoada por pretas letras que surgem dentro do pensamento. Duas taças, a minha é a cheia e a sua, fiel companheira Solidão, é a vazia. Um brinde a nós duas e um gole. E eu te engulo e me embriago de você antes que pense em me engolir e eu fique bêbada pra te esquecer. Mais um brinde. Estamos juntas e somos uma. Eueela. Só lhe dão se você deixar. E você deixa. E pede mais. Um gole. E o líquido desce vinho e amargo e seco e denso desce desce desce desce desce.
elA
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